Arrendamento e Direito de Preferência


Nos contratos de arrendamento de imóvel rural, disciplinado pelo Estatuto da Terra (Lei 4504/64) e seu respectivo Regulamento (Decreto 59566/66), há diversas implicações que merecem ser analisadas com cuidado, especialmente a que diz respeito ao direito de preferência na aquisição, em caso de venda, da propriedade arrendada. Na verdade, a Lei que trata do arrendamento rural foi elaborada com o objetivo de proteger o arrendatário, observando a função social de preservação do trabalho, da produção de alimentos, da proteção à dignidade da pessoa, etc. Por esses e outros motivos, em caso de venda de propriedade rural arrendada, o arrendatário tem o direito de preferência na aquisição, conforme assim se determina o Estatuto da Terra: “No caso de alienação do imóvel arrendado, o arrendatário terá preferência para adquiri-lo em igualdade de condições, devendo o proprietário dar-lhe conhecimento da venda, a fim de que possa exercitar o direito de perempção dentro de trinta dias, a contar da notificação judicial ou comprovadamente efetuada, mediante recibo”. Com isso, torna-se importante a análise de alguns pontos da legislação e a de sua interpretação e aplicação por determinação do judiciário. Inicialmente, é preciso conferir especial importância à caracterização do contrato em arrendamento ou parceria, no momento de sua elaboração. Caso o contrato seja, efetivamente, de parceira, não cabe direito de preferência. Quanto à notificação do arrendatário, a lei não exige, porém o ideal é que seja feita por meio de Cartório de Títulos e documentos, de forma que não haja dúvidas quanto ao conhecimento da proposta de compra e venda, respeitado, ainda, o prazo de trinta dias para o exercício do direito. Outra questão diz respeito à “igualdade de condições”. Ou seja, não adianta notificar, informando determinada proposta e, posteriormente, formalizar a venda em condições mais benéficas. Neste caso, o arrendatário poderá questionar judicialmente a transação e, depositando o preço segundo as condições de venda realmente negociadas, adquirir o imóvel. O ideal é que o contrato de arrendamento seja registrado na matrícula do imóvel. Contudo, ainda que não registrado, o arrendatário pode exercer o direito de preferência. Quando houver mais de um arrendatário para a mesma área, a questão é mais complexa. Qualquer um dos arrendatários poderá exercer o direito de preferência, ou seja, todos devem ser devidamente notificados. Contudo, tal direito somente poderá ser exercido sobre a totalidade da área arrendada. Em caso de ausência de notificação, ou de notificação irregular que não atenda às determinações legais, o arrendatário terá o prazo de seis meses, contados do registro da escritura pública de compra e venda, para depositar o preço de venda e exercer o direito, judicialmente, de aquisição do imóvel. Vale ressaltar que é comum a formalização de transações de compra e venda de propriedades rurais por meio de instrumento particular, pela impossibilidade ou opção de assinar a escritura pública em data futura, o que prorroga a insegurança de um negócio efetivado sem as observâncias legais. Além disso, é comum que da transação conste determinado valor quando da elaboração de contrato particular de compra e venda e outro valor, significativamente menor, quando da escritura pública de compra e venda. Tal prática é utilizada com o objetivo de redução dos impostos devidos. Nesse caso, o entendimento já adotado pelo Superior Tribunal de Justiça é o de que o valor a ser depositado para que seja exercido o direito de preferência é o que consta da escritura pública. Ou seja, o risco para o vendedor e para o terceiro comprador é muito grande. Além da ilegalidade perante o fisco, abre-se uma janela que permite ao arrendatário exercer seu direito de preferência por valor menor que o efetivamente transacionado. O risco é tão grande que ainda que o arrendatário seja devidamente notificado e a transação seja concluída pelo valor constante da notificação, havendo registro de escritura pública em que conste valor menor que o da notificação, a via para exercer o direito de preferência estará aberta e as partes, proprietário e terceiro adquirente, poderão sofrer grandes prejuízos. O arrendatário, por sua vez, poderá ser beneficiado com a aquisição da área por uma pechincha. Fábio Lamonica Pereira Advogado em Direito do Agronegócio Publicado na edição n. 56 da Revista AgroDBO


Postado por:
Fábio Lamonica Pereira

Advogado em Direito do Agronegócio

lamonica@lamonica.adv.br